Hormisda I

 Nota: Para outras pessoas de mesmo nome, veja Hormisda.
Hormisda I
Xainxá de arianos e não arianos
Hormisda I
Efígie de Hormisda num dracma de seu reinado. Sobre sua coroa usa o penteado chamado corimbo
Rei da Armênia
Reinado ca. 252-270
Antecessor(a) Tiridates II (arsácida)
Sucessor(a) Narses I
xá do Império Sassânida
Reinado 270-271
Predecessor(a) Sapor I
Sucessor(a) Vararanes I
 
Nascimento século III
Morte 271
Dinastia sassânida
Pai Sapor I
Mãe Cornanzém (?)
Religião Zoroastrismo

Hormisda Artaxes, mais conhecido por seu nome dinástico de Hormisda I (em persa médio: 𐭠𐭥𐭧𐭥𐭬𐭦𐭣; romaniz.:Hormizd; em latim: Hormisda; em grego: Ορμισδας; romaniz.:Ormisdas), foi o terceiro xainxá do Império Sassânida, que governou de maio de 270 a junho de 271. Era o terceiro filho de Sapor I (r. 240–270), sob quem foi governador-rei da Armênia, e também participou das guerras de seu pai contra o Império Romano. O breve período de Hormisda I como governante foi praticamente monótono. Construiu a cidade de Hormisda-Ardaxir (atual Avaz), que hoje continua sendo uma grande cidade no Irã. Promoveu o sacerdote zoroastrista Cartir ao posto de sacerdote principal (mobede) e deu ao profeta maniqueísta Maniqueu permissão para continuar sua pregação. Foi sob Hormisda I que o título de "xainxá de arianos e não arianos" foi regularizado na cunhagem do Império Sassânida; anteriormente, o título real era geralmente "xainxá dos arianos". Hormisda I foi sucedido por seu irmão mais velho, Vararanes I.

Nome

O teônimo Hormisda é a versão latinização do persa médio Hormisde (𐭠𐭥𐭧𐭥𐭬𐭦𐭣; Hormizd),[1] Ormasde (Ōhrmazd),[2] Hormosde / Ormosde ((H)ormozd),[3] Ormusde (Ormozd)[4] ou Oramasde (Ohramazd), o nome da divindade suprema no zoroastrismo, cujo nome avéstico era Aúra-Masda (Ahura-Mazdāh). O equivalente persa antigo era Auramasda (Auramazdā); [5][6] o grego era Hormisdas (Ορμίσδας), Hormisdes (Ορμίσδης), Horomazes (Ωρομάζης) e Hormisdates (Ορμισδάτης); o árabe era Hormuz (هرمز); o armênio era Oramasde (Օրամազդ; Oramazd)[7] e Ormisde (Ormizd, Որմիզդ); e o georgiano era Urmisde (ურმიზდი, Urmizd.[8][9] Seu nome pessoal era "Hormisda Artaxes", uma combinação de "Hormisda" e "Artaxes", sendo este último o equivalente grego do persa médio Ardaxir (Ardashir), que derivou do persa antigo Ṛtaxšira (também escrito Artaxšaçā), que significa "cujo reinado é através da verdade (asha)".[10][11]

Vida

Família

Hormisda era o terceiro filho de Sapor I (r. 240–270).[12] Segundo a tradição posterior, a mãe de Hormisda era Curdezade, filha do dinasta parta Miraces, que por vezes se assume ser a Cornanzém citada na inscrição Feitos do Divino Sapor presente no Cubo de Zaratustra.[13][14] Seus dois irmãos mais velhos eram Vararanes (o mais velho) e Sapor, enquanto Narses era seu irmão mais novo.[12] Tinha duas irmãs chamadas Aduranaíde e Saburductace.[15][16] Seu avô foi Artaxes I, o fundador do Império Sassânida. Os sassânidas suplantaram o Império Arsácida como soberanos do Irã em 224, quando Artaxes derrotou e matou o último xainxá arsácida Artabano IV (r. 213–224) na Batalha de Hormusgã.[17]

Ascensão

Dracma de Tiridates II (r. 217–252)

Hormisda é citado pela primeira vez durante as guerras de Sapor I contra o Império Romano. Em 252, Sapor conquistou o Reino da Armênia ao expulsar o arsácida Tiridates II (r. 217–252)[18] e nomeou seu filho Hormisda como "grão-rei dos armênios" (Wuzurg Šāh Arminān), um título prestigioso criado para aplacar os armênios.[19][20][21] Muitos historiadores modernos acreditam que Hormisda tenha participado na segunda expedição romana de Sapor I, que ocorreu nas províncias romanas da Síria, Cilícia e Capadócia, e que durou de 253 a 256. Isto é apoiado pelos relatórios das conquistas da Capadócia. Nos Feitos do Divino Sapor, o xainxá registro uma sucessão de cidades conquistas ao longo da guerra:

Anata, Birta de Arupã, Birta de Esforacena [Asporacã], Sura, Barbalisso, Mambuque [Hierápolis], Alepo [Beroia], Quinacerim [Cálcis], Apameia, Rafaneia, Zeugma, Úrima, Gindaro, Larmenaza, Selêucia, Antioquia, Cirro, [outra] Selêucia, Alexandreta, Nicópolis, Sinzara, Hama, Arrastane, Dicor, Dolique, Dura, Circúsio [Circésio], Germanícia, Batna e Quanar, e na Capadócia as cidades de Satala, Domana, Artangil, Suisa, Sinda, Freata. Um total de 37 cidades com cercanias.
Dinar de Sapor I

A informação disponível indica que foram ocupadas numa sucessão de campanhas, com Antioquia como objetivo final, e a ordem que aparecem pode indicar a rota.[19] A julgar pelo provável caminho seguido pelas tropas de Sapor, as cidades capadócias listadas foram incluídas sob a forma de apêndice na inscrição, pois é mais plausível supor que foram conquistadas por Hormisda a partir da Armênia.[22] A Capadócia não parece ter sido a única área em que Hormisda lutou: de acordo com a História Augusta, o rebelde romano Ciríades ajudou Sapor I e certo Odomastes na conquista de Antioquia. O nome Odomastes é uma transliteração incorreta de Hormisda e pode, portanto, sugerir que depois de saquear a Capadócia, Hormisda participou do cerco de Antioquia em 253.[5] O historiador armênio Agatângelo, do século IV, afirma que este título só foi dado ao herdeiro do xainxá.[21] Quando Sapor I estava em seu leito de morte, coroou Hormisda como o novo xainxá dos arianos, em maio de 270.[17][23]

Reinado

Inscrição de Cartir em Naquexe-e Rajabe

Pouco se sabe sobre o reinado de Hormisda. Supostamente deu ao sacerdote zoroastrista Cartir roupas que eram usadas pela classe alta, o boné e o cinto (culafe e camarbande) e o nomeou sacerdote principal (mobede).[5][24] Tal como o seu pai, também concedeu ao profeta maniqueísta Maniqueu permissão para continuar a sua pregação.[25] Não está claro por que Hormisda apoiou Cartir e Maniqueu, ambos representando uma religião diferente.[26] O iranólogo Touraj Daryaee sugeriu que isso possivelmente fazia parte de sua tentativa de controlar ambas as religiões, que buscavam se tornar a principal religião do império.[27] De acordo com o iranólogo Prods Oktor Skjaervo, Hormisda era como seus dois antecessores, um "zoroastrista morno".[28] Geralmente recebeu o epíteto de nēw ou yaxī/yaxē (ambos significando "corajoso") em fontes maniqueístas do Médio Irã, possivelmente indicando suas realizações na guerra. Foi aparentemente sob Hormisda que os dois festivais de Ano Novo (Noruz) no mês de Faruardim foram unidos para criar um festival que durou seis dias.[29] Em fontes primárias, é creditado como o fundador da cidade de Hormisda-Ardaxir (atual Avaz), no entanto, em alguns casos, Artaxes I também é atribuído como seu fundador. Historiadores modernos (citando As Capitais Provinciais do Irã) geralmente consideram-no como o verdadeiro fundador.[5] Também fundou a cidade de Rã-Hormisda-Ardaxir (que significa "paz de Hormisda de Ardaxir"), abreviada como Rã-Hormisda.[30] Fundou novamente a cidade de Artemita como Dartaguirde, cuja residência real serviria mais tarde importante aos xainxás Cosroes I (r. 531–579) e Cosroes II (r. 590–628).[31][32] Hormisda não foi sucedido por seu filho Hormosdaces, mas por seu irmão Vararanes (que ficou conhecido como Vararanes I), que ascendeu ao trono com a ajuda de Cartir. De acordo com o folclore local, Hormisda foi enterrado em Rã-Hormisda.[31]

Cunhagem e ideologia imperial

Dracma de Hormisda

Enquanto Artaxes I e Sapor I geralmente usavam o título de "xainxá [rei dos reis] dos (arianos)" em suas moedas, Hormisda teve o título ligeiramente modificado, adicionando a frase "e não arianos". Seu título completo era, portanto, "o divino Hormisda divino, adorador de Masda, xainxá dos arianos e não arianos, cuja imagem/brilho vem dos deuses" (Mazdēsn bay Ōhrmazd šāhān šāh Ērān ud Anērān kēčihr az yazdān).[33][34] A frase "e não arianos" já havia sido usada nas inscrições de Sapor I,[35] e em casos raros em suas cunhagens,[36] mas foi regularizada pela primeira vez sob Hormisda.[35] O título estendido demonstra a incorporação de novo território ao império, porém o que foi precisamente visto como "não ariano" (aneran) não é certo.[5] O reverso da cunhagem de Hormisda retratava dois atendentes, um acréscimo que foi feito pela primeira vez por Sapor I, em cuja cunhagem ambos os atendentes são retratados usando coroas murais, enquanto desviam o olhar do templo do fogo entre eles. Eles provavelmente representavam o xainxá.[37] Na cunhagem de Hormisda, os atendentes ficam de frente ao templo e usam coroas diferentes. A figura do lado esquerdo representa Hormisda, enquanto a figura da direita - dependendo da sua representação - representa as divindades iranianas Mitra ou Anaíta.[38]

Ver também

Precedido por
Tiridates II
Rei da Armênia
ca. 252-270
Sucedido por
Narses I
Precedido por
Sapor I
Xá do Império Sassânida
270-271
Sucedido por
Vararanes I

Referências

  1. Lukonin 1967, p. 217.
  2. Kellens 2009, p. 292; 295.
  3. Aḥsan 1992, p. 312.
  4. Murray 1985, p. 35.
  5. a b c d e Shayegan 2004, p. 462-464.
  6. Vevaina 2018, p. 1110.
  7. Justi 1895, p. 7-10.
  8. Schmitt 1986, p. 445–465.
  9. Rapp 2014, p. 341-343.
  10. Schmitt 1986, p. 654–655.
  11. Wiesehöfer 1986, p. 371–376.
  12. a b Shahbazi 1988, p. 514–522.
  13. Ursula 2018b.
  14. Pourshariati 2008, p. 46–47.
  15. Brosius 2000.
  16. Gignoux 1983, p. 472.
  17. a b Shahbazi 2005.
  18. Harries 2012, p. 36.
  19. a b Shahbazi 2002.
  20. Kia 2016, p. 233.
  21. a b Weber 2016.
  22. Rostovtzeff 1943, p. 26-27.
  23. Tabari 1999, p. 39, 43.
  24. Daryaee 2014, p. 76.
  25. Holl 2006, p. 60, nota 1.
  26. Kia 2016, p. 246.
  27. Daryaee 2014, p. 10.
  28. Skjærvø 2012.
  29. Stausberg 2015, p. 383.
  30. Jalalipour 2015, p. 15–16.
  31. a b Badiyi 2020, p. 210.
  32. Brunner 1983, p. 758.
  33. Schindel 2013, p. 836.
  34. Shayegan 2013, p. 805.
  35. a b Curtis 2008, p. 21.
  36. Curtis 2008, p. 23.
  37. Schindel 2013, p. 835.
  38. Curtis 2008, p. 24.

Bibliografia

  • Aḥsan, ʻAbdushshakūr (1992). Studies in Persian Language and Literature. Laore, Paquistão: Bazm-e-Iqbal 
  • Badiyi, Bahram (2020). «Cities and Mint Centers Founded by the Sasanians». Ancient Iranian Numismatics: 203–233. ISBN 978-90-04-46072-0. doi:10.1163/9789004460720_012 
  • Brosius, Maria (2000). «Women i. In Pre-Islamic Persia». Enciclopédia Irânica. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia }
  • Brunner, Christopher (1983). «Geographical and Administrative divisions: Settlements and Economy». In: Yarshater, Ehsan. The Cambridge History of Iran, Volume 3(2): The Seleucid, Parthian and Sasanian Periods. Cambridge: Cambridge University Press. pp. 747–778. ISBN 0-521-24693-8 
  • Curtis, Vesta Sarkhosh; Stewart, Sarah (2008). The Sasanian Era. Nova Iorque: I. B. Tauris. ISBN 9780857719720  A referência emprega parâmetros obsoletos |coautor= (ajuda)
  • Daryaee, Touraj (2014). Sasanian Persia: The Rise and Fall of an Empire. Nova Iorque: I. B. Tauris. ISBN 978-0857716668 
  • Gignoux, Ph. (1983). «Ādur-Anāhīd». Enciclopédia Irânica, Vol. I, Fasc. 5. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia 
  • Harries, Jill (2012). Imperial Rome AD 284 to 363. Edimburgo: Imprensa da Universidade de Edimburgo 
  • Holl, Karl (2006). The Distinctive Elements in Christianity. Eugene, Oregon: Wipf & Stock Publishers 
  • Jalalipour, Saeid (2015). «The Arab Conquest of Persia: The Khūzistān Province before and after the Muslims Triumph» (PDF). Sasanika 
  • Justi, Ferdinand (1895). Iranisches Namenbuch. Marburgo: N. G. Elwertsche Verlagsbuchhandlung 
  • Kellens, Jean (2009). Zarathushtra entre l'Inde et l'Iran études indo-iraniennes et indo-européennes offertes à Jean Kellens à l'occasion de son 65e anniversaire. Viesbade: L. Reichert 
  • Kia, Mehrdad (2016). The Persian Empire: A Historical Encyclopedia [2 volumes]. Santa Bárbara: ABC-CLIO. ISBN 978-1610693912 
  • Lukonin, Vladimir Grigorʹevich (1967). Persia II. Cleveland: World Publishing Company 
  • Murray, John (1985). Samarkand. Battle Creek, Michigão: Ellis. ISBN 9780856281518 
  • Pourshariati, Parvaneh (2008). Decline and Fall of the Sasanian Empire: The Sasanian-Parthian Confederacy and the Arab Conquest of Iran. Nova Iorque: IB Tauris & Co Ltd. ISBN 978-1-84511-645-3 
  • Rapp, Stephen H. Jr. (2014). The Sasanian World through Georgian Eyes: Caucasia and the Iranian Commonwealth in Late Antique Georgian Literature. Farnham: Ashgate Publishing, Ltd. ISBN 1472425529 
  • Rostovtzeff, Michael I. (1943). «Res Gestae Divi Saporis and Dura». In: Harold Ingolt. Berytus Archeological Studies. 8. Beirute: The Museum of Archeology of The American Unversity of Beirut 
  • Schindel, Nikolaus (2013). «Sasanian Coinage». In: Potts, Daniel T. The Oxford Handbook of Ancient Iran. Oxônia: Imprensa da Universidade de Oxônia. ISBN 978-0199733309 
  • Schmitt, R. (1986). «Artaxerxes». Enciclopédia Irânica, Vol. II, Fasc. 6. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia. pp. 654–655 
  • Shahbazi, A. Shapur (1988). «Bahrām I». Enciclopédia Irânica Vol. III, Fasc. 5. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia 
  • Shahbazi, Shapur (2002). «ŠĀPUR I: History». Enciclopédia Irânica 
  • Shahbazi, A. Shapur (2005). «Sasanian Dynasty». Enciclopédia Irânica. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia 
  • Shayegan, M. Rahim (2004). «Hormozd I». Enciclopédia Irânica, Vol. XII, Fasc. 5. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia. pp. 462–464 
  • Shayegan, M. Rahim (2013). «Sasanian Political Ideology». In: Potts, Daniel T. The Oxford Handbook of Ancient Iran. Oxônia: Imprensa da Universidade de Oxônia. ISBN 978-0-19-973330-9 
  • Skjærvø, Prods Oktor (2012). «Kartir». Enciclopédia Irânica. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia 
  • Stausberg, Michael; Vevaina, Yuhan Sohrab-Dinshaw; Tessmann, Anna (2015). The Wiley Blackwell Companion to Zoroastrianism. Hoboquém, Nova Jérsei: John Wiley & Sons, Ltd  A referência emprega parâmetros obsoletos |coautor= (ajuda)
  • Tabari (1999). Bosworth, C.E., ed. The History of al-Tabari Vol. V - The Sasanids, The Byzantines, the Lakhmids and Yemen. Nova Iorque: Imprensa da Universidade Estadual de Nova Iorque 
  • «Kurdzād*1, Frau Šābuhrs I. und Mutter Hormezd I.[îamza al-I§fahānī]» (PDF). 2018b 
  • Vevaina, Yuhan; Canepa, Matthew (2018). «Ohrmazd». In: Nicholson, Oliver. The Oxford Dictionary of Late Antiquity. Oxônia: Imprensa da Universidade de Oxônia. ISBN 978-0-19-866277-8  A referência emprega parâmetros obsoletos |coautor= (ajuda)
  • Weber, Ursula (2016). «Narseh». Enciclopédia Irânica. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia 
  • Wiesehöfer, Joseph (1986). «Ardašīr I i. History». Enciclopédia Irânica, Vol. II, Fasc. 4. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia. pp. 371–376 
Controle de autoridade
  • Wd: Q310287
  • WorldCat
  • VIAF: 7750167807396818130001
  • BMT: 109714
  • EBID: ID